Ao contrário de Mateus, Rita era uma rapariga exemplar. Muito calma, pouco falava, mas quando falava dizia palavras sábias de mais para a idade que tinha, pondo até os mais velhos estupefactos.
Aí lá eles começavam a tricotar que era a cara chapada a mãe: inteligente e linda, de onde se destacava o seu sorriso contagiante, chegando a por a sorrir o Joaquim, o homem mais carrancudo lá da freguesia. Rapidamente se esqueciam dos problemas estando ela por perto. Era um autêntico anjo com os seus cabelos louros e com os seus olhos azuis brilhantes. Olhos estes que saíram ao seu pai.
“Oh Mateus! Que estás a fazer aí deitado no chão?”, apareceu ela a correr e a olhar muito pasmada para o Mateus.
“Ome, tropecei aqui na raiz de uma roca... Quié que aconteceu?”
“O pai já está fulo sem saber por onde andas.”
“Fogo, já vou, já vou!”
Era praticamente de noite quando os dois estavam a chegar a casa. Estava um tempo meio melindroso, com a aparência de que estava para vir mau tempo. Ao longe já se avistava, a partir da varanda da casa, nuvens negras vindas do mar a aproximarem-se para a terra. Júlio, vendo este mau presságio a aproximar-se, decide ir rapidamente colher a roupa que estava a secar na linha pedindo ao Mateus ajuda para tal tarefa. Assim que estavam acabando de colher a última peça de roupa, Júlio sente um pingo grosso a bater-lhe na testa, e a seguir outro, e outro, e outro, e outro, até ao ponto de já estar a chover torrencialmente. Ambos fugiram para o abrigo que se situava ainda um pouco desviado da casa, onde esperava a Rita pelos dois homens.
Entretanto, enquanto ambos esperavam que a chuva amainasse, Mateus olhou para o pai que observava atentamente o céu na esperança de ver sinais de bonança.
“Pai...?”
“Quié que queres?”
“Tens saudades da mãe?”
Júlio, ouvindo esta palavras da boca do filho, pára de fitar o céu e olha para o filho, olhos nos olhos, cara à cara.
“Sinto filho. Sinto muitas...”
Mateus até estranhou esta face do seu pai. Já nem reconhecia este seu lado requintado de calma, de simpatia, de carinho. Todo este momento fez com que remontasse logo aos tempos em que o pai levava toda a família a dar passeios junto ao mar, numa praia onde, com o por do sol, qualquer casal se perdia, porque enquanto o sol se punha fazia cada vez mais frio, justificando o facto de terem que se abraçar, não só para manter o calor dos corpos, mas também para confraternizar o amor entre ambos, ou seja, era como que se fosse o calor que aquecia o ferro, para que este pudesse ser moldado na forma mais perfeita, tendo como fim o amor sólido para toda a vida.
De repente lembrou-se de um desses passeios. O sol já se estava a pôr e a família já procurava o regresso a casa. De repente, o pai olha para uma das casas, que mais se sobressaia entre as outras, e disse com um tom de afirmação: “Aquela ainda vai ser nossa casa! Vai ser ali que vamos fazer as nossas árvores de Natal. Vai ser ali que os nossos filhos vão crescer! Vai ser ali que vamos ser ainda mais felizes!”
De forma espontânea estes pensamentos foram rompidos pelo aviso do pai de que o tempo já estava a amainar e que iam procurar a casa.